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O PRECURSOR DO ABOLICIONISMO NO BRASIL
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Eis que encontra, postado numa esquina,
um esperto, ardiloso capadocio,
dos que mofam da pobre humanidade,
vivendo, por milagre, em santo ócio.

— Olá, senhor meu amo — lhe pergunta
o pobre do matuto, agoniado —
por aqui não passou o meu burrego,
que tem ruço o focinho, o pé calçado?

Responde-lhe o tratante, em tom de mofa:
— O seu burro, senhor, aqui passou,
mas um guapo Ministro fê-lo presa
E num parvo Barão o transformou!

— O’ Virgem Santa! — exclama o tabaréu
da cabeça tirando o seu chapeu —
Se me pilha o Ministro, neste estado,
Serei Conde, Marquês e Deputado!

Gama invetiva, com o seu riso e o seu sarcasmo, os defeitos de seu tempo. Não é, note-se bem, um humorista, ao feitio inglês, comentador de fatos a que quizesse sarjar a nota do ridículo pelo jogo displicente da contradição. Como legitimo satírico, ao gosto clássico, ele é moralista, a quem calha otimamente a divisa celebre de Santeul, na tenda do Arlequim “Castigat ridendo mores”. Gama quer realmente concertar malfeitorias, remover agravos e corrigir os erros do mundo, como tipo de acção que inegavelmente era e que trazia, portanto, como fôrro da propria personalidade, a tendencia central do mestre-escola.